Curso Formação Conservadora

Jair Bolsonaro não foi reeleito e foi condenado inelegível por oito anos. Mas apesar de teoricamente enfraquecido, o bolsonarismo continua a existir e ainda representa um grande perigo à democracia brasileira. Figuras como Bolsonaro não podem ser consideradas fenômenos individuais e apenas no contexto dos seus mandatos. O objetivo nunca é simplesmente ganhar eleições, mas sim mudar as sociedades. E nisso a extrema direita no mundo tem sido assustadoramente bem-sucedida.

O bolsonarismo continua presente em toda parte na política: nos parlamentos, nas comissões dentro do Congresso Nacional, mas também fora da institucionalidade. Existem numerosas redes de extrema direita em todo o país, que por sua vez são conectadas a redes internacionais, muitas vezes completamente subestimadas pela mídia. 

Um desses projetos é o “Formação Conservadora”, fundado pelo deputado federal Eduardo Bolsonaro, filho do ex-presidente, em abril de 2023. De acordo com o site, o curso é 100% online, com conteúdos de áudio e vídeo e custa R$ 598,80. A meta é “retomar todo o espaço que foi ocupado pela esquerda: politica, universidades, escolas, comunidades locais”. Os membros que observamos nos chats são diversos e todos compartilham uma forte identificação com o ex-presidente Bolsonaro. Chama a atenção o fato de que muitos membros parecem ter mais de 50 anos e parece haver mais homens do que mulheres. De acordo com o seu próprio comunicado, o objetivo da plataforma online é formar líderes e preparar conservadores para a “guerra cultural”. Na plataforma, há cursos online sobre diversos temas, voltados para a possibilidade de troca com pessoas que pensam da mesma maneira com o intuito de formar uma comuni- 5 Curso Formação conservadora: Como pensa a extrema direita brasileira? dade e uma conversa mensal com Eduardo Bolsonaro. O lema do projeto é: “Há uma guerra em andamento e o Brasil precisa de você”. 

Em seus discursos, a direita brasileira aproxima-se dos debates da extrema direita em outros países. Afirma-se que a esquerda se instalou em todas as instituições, na cultura, na educação e se infiltrou na sociedade. No trailer da plataforma a fala de Eduardo Bolsonaro deixa clara a estratégia de promover o pânico moral: “A nossa fé tem sido vilipendiada, uma minoria sem escrúpulos tomou conta do país, os nossos filhos são submetidos às doutrinas mais nefastas e a liberdade de expressão nos foi tomada. Então, se nós quisermos viver em paz e ter um futuro como nação, a gente tem que se mexer antes que seja tarde demais e resgatar o Brasil das garras da esquerda”. 

A “Formação Conservadora” é apenas um exemplo de como a extrema direita no Brasil está investindo na guerra cultural - apesar da derrota eleitoral -, mas as sugestões de pautas, detalhamento das conversas, os convidados do programa, são uma amostra bastante importante desse universo. 

Durante o curso, Eduardo Bolsonaro e seus convidados também dão pistas de como as forças estão sendo somadas a importantes redes da extrema direita internacional, como mostram os capítulos a seguir. É possível afirmar que ele é um dos mais importantes representantes brasileiros dessas redes. Ele mantém contatos estreitos com a Europa - incluindo o partido da extrema direita alemã AfD1 , com o primeiro-ministro da Hungria Viktor Orbán2 , tido como um dos maiores líderes da extrema direita no mundo - e com representantes nos EUA. Como detalha uma reportagem da Agência Pública3 , o deputado teve ao menos 125 reuniões com membros da extrema direita do continente americano. Durante o curso, Eduardo cita Orbán muitas vezes e faz questão de se dizer próximo ao primeiro-ministro. Durante uma das aulas afirma: “eu tenho uma articulação internacional, já estive com [José Antonio] Kast, [Javier] Milei, [Donald] Trump, com o pessoal do VOX, gente ligada a Marie Le Pen na França”. Eduardo também tem representado o Brasil em importantes eventos internacionais como o CPAC (Conservative Political Action Conference) - maior congresso conservador dos Estados Unidos e um dos maiores do mundo - que recentemente tem sido exportado para outros países como a Hungria, México, Brasil e inclusive terá uma nova edição no país, coordenada por Eduardo Bolsonaro, em 2024. 

Eduardo tem sido um ator cada vez mais proeminente nas redes de extrema direita internacional e o principal representante do Brasil em encontros como o CPAC. Mais articulado que seu pai, deputado mais votado do Brasil em 2018 com 1,84 milhão de votos e com notável capilaridade nas redes sociais, tem um plano claro de poder, como mostra esse curso de formação. 

É preciso monitorar as atividades de figuras como Eduardo Bolsonaro, entender os fundamentos ideológicos do bolsonarismo e como ele se relaciona às forças da extrema direita no mundo para que o autoritarismo não ressurja no Brasil ainda mais fortalecido. Para escrever esse paper nos inscrevemos no programa online e assistimos todos os cursos do seminário.