Orçamento 2013 e o retrocesso na transparência

O Projeto de Lei Orçamentária de 2013 (PLOA 2013) está tramitando no Congresso Nacional desde o último dia 30 de agosto para a apreciação dos/as parlamentares. Não apresenta nenhuma surpresa, mas causa decepção aos movimentos e organizações que buscaram o diálogo com o governo para torná-lo mais transparente. As modificações levadas a cabo pela equipe do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão (MPOG), e que constam do PLOA 2013, podem servir para facilitar a vida dos gestores dos programas e ações previstos, mas com certeza retrocedem na transparência do efetivo gasto com as ações governamentais. E mais, significam desrespeito a tudo que vinha sendo negociado com a Secretaria do Orçamento Federal (SOF), com a chancela da Secretaria Geral da Presidência da Republica.

Tão logo tomaram conhecimento das modificações que estavam sendo gestadas no interior do governo sem nenhuma publicação, nem para a sociedade nem para o Parlamento, alertados por Inesc e Cfemea, mais de noventa movimentos e organizações assinaram uma carta denunciando as mudanças e reivindicando a democratização do processo orçamentário [1]. A partir dessa mobilização e com a intermediação da presidência da Comissão Mista de Orçamento, foi aberto um diálogo com o governo e com o relator da Lei de Diretrizes Orçamentárias para 2013.

Naquela ocasião, ficou evidente a resistência do governo, ou de parte dele, em adotar medidas sugeridas pelo Parlamento para garantir a transparência e o respeito ao direito que tem a sociedade de saber exatamente aonde são aplicados os recursos advindos dos impostos pagos. Eram principalmente medidas que asseguravam a continuidade de uma série histórica que permitisse a análise dos investimentos nas políticas publicas e que visavam garantir transparência e melhores condições para o controle social sobre o Orçamento Público, mediante um instrumento novo chamado “Plano Orçamentário”. Trata-se de um recurso utilizado pelos ministérios para detalhar, internamente, seu orçamento.

As razões do veto foram assim explicitadas: "O Plano Orçamentário – P.O. é um instrumento gerencial, de caráter facultativo, e tem por finalidade permitir que tanto a elaboração do orçamento quanto o acompanhamento físico e financeiro da execução ocorram num nível mais detalhado. Os dispositivos em questão ampliam demasiadamente os objetivos do P.O., de tal forma que seria inexequível abarcar todas as situações ali previstas". Como argumentaram as consultorias do Congresso Nacional em nota conjunta, “o PLDO 2013 (...) pretendia normatizar a criação do PO”, para que pudéssemos manter o histórico de algumas ações orçamentárias monitoradas e ter mais transparência em relação às mudanças.  Da forma como ficou o texto final da LDO 2013, não há garantia nenhuma de que o detalhamento das ações será disponibilizado para acesso público.

Sem os Planos Orçamentários, o Parlamento, que deve analisar a proposta orçamentária para 2013, não tem, no momento, nenhum conhecimento sobre como serão aplicados os recursos para algumas ações orçamentárias que foram agregadas. Isso dificulta a participação dos/as parlamentares e das organizações da sociedade civil no debate sobre a lei orçamentária e no seu acompanhamento.

A LOA 2013

Uma primeira consulta ao texto do PLOA 2013, publicado na página oficial do MPOG, permite concluir que nenhuma das reivindicações feitas pelos movimentos e organizações que dialogaram com o governo foi atendida. O número de ações orçamentárias foi reduzido. O que se tem agora são ações guarda-chuva que escondem outras ações que existiam anteriormente e que, doravante, não serão mais publicizadas, impossibilitando seu monitoramento por parte dos/das parlamentares e de organizações da sociedade civil. Além disso, a ausência de uma matriz que demonstre a correspondência entre o que foi alterado e o que passa a vigorar impede a continuidade do trabalho realizado há anos por várias organizações e movimentos. Em nome da aplicação de uma matriz genérica e de caráter estritamente gerencial, se sacrifica a transparência dos gastos públicos e o controle social.

Segue abaixo um exemplo que demonstra como as mudanças efetuadas deixaram o orçamento menos transparente, com menor possibilidade de discussão de prioridades por parte do Parlamento e das organizações da sociedade civil e com dificuldades extras para o monitoramento e a participação social.

Duas iniciativas presentes na Lei Orçamentária de 2012, de prestação de assistência técnica e extensão rural para diversos grupos foram aglutinadas na proposta orçamentária para 2013.

Antes era possível identificar ações específicas para diferentes grupos:

  • Povos indígenas;
  • Agricultores/as familiares;
  • Agentes de assistência técnica;
  • Assentados da reforma agrária;
  • Comunidades quilombolas;
  • Mulheres rurais.

Esses grupos possuem movimentos sociais organizados e organizações representativas que acompanham as políticas públicas e o orçamento alocado para a realização de seus direitos. Com as mudanças, esta ação política será inviabilizada.

A nova categoria orçamentária criada pelo governo federal, chamada de Iniciativa - que deveria identificar com clareza os bens e serviços que serão entregues à sociedade - devido à busca frenética por eficiência gerencial do atual governo, acaba por virar uma panaceia. O corte e cola feito pelo governo nas iniciativas abaixo impede a transparência e a desagregação de ações que são fundamentais em um país diverso e desigual como o Brasil. Conforme se observa no quadro abaixo, os textos de duas iniciativas foram colados e o número de ações orçamentárias foi reduzido de seis, para duas.

 

Programa 2012 – Agricultura Familiar

Veja o quadro aqui.

 

Há muitos anos que organizações e movimentos sociais, em uma ação política da mais alta relevância para a consolidação dos mecanismos e a efetivação da democracia brasileira, acompanham e monitoram o desenvolvimento e a aplicação de recursos em políticas específicas, fundamentais para a garantia, a defesa e a ampliação de direitos conquistados a partir de lutas históricas. Isso não será mais possível devido às mudanças que o governo federal operou, chamadas de gerenciais, na forma de apresentar o orçamento. Agora, o gestor de determinado programa poderá deslocar recursos de uma determinada finalidade para outra, desde que fiquem abrigados pelas ações guarda-chuva, que, de tão amplas e pouco definidas, abrangem quase tudo. Essas transações não serão visíveis aos cidadãos e cidadãs, tornando a execução orçamentária opaca e indo, consequentemente, na contramão da transparência orçamentária, tão essencial para a democracia.

Esse é um tremendo retrocesso para um governo que acabou de aprovar uma avançada Lei de Acesso à Informação e que preside uma Parceria Internacional para Governos Abertos. Além disso, é incongruente com o discurso de que a participação social seria um método de governo.

A chegada do PLOA 2013 ao Parlamento confirma o que se temia quando dos vetos à LDO: retrocesso na transparência, no controle social e no controle externo do orçamento da União. Retrocesso nas negociações e acordos já firmados com o governo. Mesmo assim, a convicção da centralidade dessas questões para o avanço democrático nos leva a permanecer dispostos ao diálogo e a continuar a ter a democratização do processo orçamentário como bandeira de luta.

Brasília, 12 de setembro de 2012.

Centro Feminista de Estudos e Assessoria – CFEMEA
Instituto de Estudos Socioeconômicos - INESC

[1] Ver Carta disponível aqui.

Fonte: CFEMEA e INESC

Fonte da imagem: http://www.flickr.com/photos/ampliato/798338821/sizes/q/in/photostream/