A última fronteira: O crime organizado transnacional e a luta contra as mudanças climáticas

No contexto do Dia Internacional de Prevenção e Combate a Todas as Formas de Crime, 15 de novembro, o escritório da  Fundação Heinrich Böll do Brasil e a Unidade da Segurança Humana também da Fundação, com sede em Viena convidou diversas especialistas para um debate virtual. 

A partir deste evento iniciaremos um diálogo para conectar os territórios mais remotos de nosso planeta à rápida expansão do crime organizado nos mais diversos contextos sociais. Entender o impacto do crime organizado transnacional nas zonas de proteção ambiental e suas consequências de longo prazo para a política climática e a biodiversidade foi o ímpeto inicial de nossas considerações.  No debate sobre estruturas institucionais e políticas que estão em transformação, bem como no debate mais amplo sobre resiliência democrática e estratégias para fortalecê-la, o crime organizado está se tornando cada vez mais um elemento de conexão no centro da análise política.

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Gráfico ilustrativo

Este gráfico apresenta diferentes agendas do crime organizado e demonstra o desafio que temos que superar. É preciso incentivar um diálogo entre as diferentes comunidades de conhecimento. As flechas vermelhas mostram quais campos políticos foram abordados no debate. 

Com a nossa discussão, A última fronteira: O crime organizado transnacional e a luta contra as mudanças climáticas, também interligamos o conceito da segurança humana com o crime organizado e as instituições das Nações Unidas, a UNDOC que trata dos assuntos diversos do crime organizado. Neste contexto aprendemos sobre como diferenciar “crime ambiental” como finalidade primária, por exemplo no caso de traficar onças ou despejar lixo tóxico numa floresta, e a destruição ambiental como consequência do crime organizado como lavagem de dinheiro em garimpo ilegal ou desmatamento apoiando grileiros – como acontece na Amazônia brasileira. 

Os nossos focos são políticas climáticas e a sua implementação em territórios remotos onde redes criminosas fortemente armadas se instalaram. Se-beneficiando do colapso da autoridade estatal eles exploram ecossistemas vulneráveis em terras indígenas, reservas extrativistas ou ambientais e territórios quilombolas, assim acelerando a degradação ambiental, a perda de biodiversidade e impossibilitando quaisquer esforços de combate ás mudanças climáticas globais.

No evento também explorávamos como a inexistência ou o enfraquecimento do monopólio estatal da violência em territórios sob regimes ambientais deixando um perigoso vácuo de poder. Os agentes criminosos nacionais e transnacionais envolvidos no tráfico de drogas, de pessoas e de armas estão expandindo seus mercados locais de drogas, investindo localmente em caça ilegal, extração ilegal de madeira e mineração ilegal de ouro ou no comércio de espécies ameaçadas de extinção para lavar seu dinheiro. Dessa forma, eles estão ampliando a influência territorial e política, além de suas atividades, não só na Amazônia, más no mundo todo. As consequências locais e globais disso são inegáveis, e pesquisas sistemáticas estão em andamento. Abaixo enumero algumas informações básicas sobre o tema:

Exploração criminosa de recursos naturais: 117 países em todo o mundo estão enfrentando mercados criminosos significativos relacionados ao tráfico e à exploração da fauna, da flora ou de recursos não renováveis. Em 36 países - na África, na Ásia e nas Américas - esses crimes ambientais são criticamente altos, ressaltando uma crise global. Neste evento, examinamos o hotspot amazônico e destacamos as ligações complexas entre a degradação ambiental, a captura do Estado por entidades criminosas e a erosão do Estado de Direito.

Estruturas jurídicas regionais e globais: Embora várias estruturas normativas já abordem o crime ambiental, ainda existem lacunas. Durante o evento mapeamos as convenções existentes e, além disso, exploramos possíveis soluções, como a proposta de um quarto protocolo para a UNTOC (Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional) sobre o tráfico ilícito de fauna e flora selvagens e nos referimos ao recentemente publicado Relatório Mundial sobre Crimes contra a Vida Selvagem (UNDOC 2024). Mencionávamos o debate do pluralismo jurídico e direitos da natureza como sujeito de direito na mitigação da crise climática e o possível reconhecimento do Ecocídio como um crime internacional.

Exploração criminosa de recursos naturais: 117 países em todo o mundo estão lidando com mercados criminosos significativos relacionados ao tráfico e à exploração da fauna, da flora ou de recursos não renováveis. Em 36 países - na África, na Ásia e nas Américas - esses crimes ambientais são criticamente altos, ressaltando uma crise global. Examinaremos o hotspot amazônico e destacaremos as ligações complexas entre a degradação ambiental, a captura do Estado por entidades criminosas e a erosão do estado de direito.

A crise da autoridade do Estado: Em muitas regiões, o crime organizado prospera devido ao fracasso dos atores estatais em promover políticas públicas e manter o controle. O que essa fraqueza do monopólio do Estado sobre a violência significa para as comunidades locais e para os esforços climáticos globais? Exploramos abordagens inovadoras para a reforma do setor de segurança, em que os atores locais propõem novas definições de segurança que atendam às diversas realidades culturais e ambientais. A rede Creating Safer Space apoiando 26 projetos de pesquisa no mundo que trabalham sobre a UCP (Unarmed Civilian Protection/ proteção civil desarmada) e a autoproteção de comunidades sem armas é um destes exemplos.

A última fronteira: A Amazônia brasileira, a Bacia do Congo, na África, e as áreas remanescentes de florestas tropicais preservadas do Sudeste Asiático são as últimas fronteiras na luta contra a mudança climática e a perda de biodiversidade e o conhecimento respetivo. À medida que essas áreas protegidas são invadidas pelo crime organizado, o mundo enfrenta uma ameaça tripla: perda de patrimônio cultural, colapso da biodiversidade e redução dos sumidouros naturais de carbono que são essenciais para a mitigação do clima.

 

As contribuições: 

Com a moderação da diretora da Fundação Böll no Brasil, Regine Schönenberg, Simon Ilse, chefe da Unidade Global de Segurança Humana da hbs em Viena apresentou uma introdução à estrutura institucional global e ao conceito de segurança humana.  

Roberto Araújo, antropólogo e pesquisador Sênior do Museu Paraense Emílio Goeldi (MPEG) pesquisa a criminalização da Amazônia há décadas e nos deu uma visão profunda de suas bases históricas e atuais manifestações locais. 

Carla Suárez, Coordenadora do Programa de Crimes Ambientais do UNODC (Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime) destacou a conexão de grupos do crime organizado com crimes ambientais em áreas de proteção remotas. 

Kristina Amerhauser, analista sênior que trabalha no projeto da Global Initiatives-TOC sobre crimes ambientais chamado ECO-SOLVE lidera um projeto sobre corrupção. Ela também co-lidera o trabalho da organização sobre fluxos financeiros ilícitos. Neste contexto, Kirstina referiu -se sobre responsabilidades e abordagens participativa do programa ECO-SOLVE em muitos paises. 

Berit Bliesemann de Guevara, cientista política e professora de Política Internacional na Universidade de Aberystwyth, no País de Gales, Reino Unido é a principal pesquisadora da Rede de Pesquisa Creating Safer Spaces (Rede AHRC-GCRF Plus “Creating Safer Space: Strengthening Civilian Protection Amidst Violent Conflict” (Fortalecimento da proteção civil em meio a conflitos violentos). A rede Creating Safer Space apoia 26 projetos de pesquisa em todo o mundo que trabalham sobre a UCP (Unarmed Civilian Protection, proteção civil desarmada) e a autoproteção de comunidades sem armas. Berit nos apresentou vários exemplos de comunidades, envolvendo estratégias desde redes locais de segurança alimentar até projetos de arte para reafirmar identidades.

Este evento contribuí como um pontapé inicial para a cooperação global entre atores ligados ao combate às mudanças climática e a comunidade de especialistas sobre segurança pública. Pesquisadores, formuladores de políticas públicas e defensores do meio ambiente devem se reunir regularmente para debater formas de preencher as lacunas das políticas e lançar novas iniciativas coletivas. Em 90 minutos, conseguimos fazer com que tópicos, métodos e campos de ação aparentemente distantes dialogassem entre si. É uma conversa que precisa ser continuada, aprofundada e ampliada para incluir outros aspectos e perspectivas. Junte-se a nós para explorar como podemos recuperar as zonas ambientais das redes criminosas e restaurar o equilíbrio entre governança, biodiversidade e resiliência climática.

 

Aqui o link para o evento: https://www.youtube.com/watch?v=k6PvVcArX7E