Representantes de organizações o Norte ao Sul do Brasil parceiras da Fundação Heinrich Böll juntos para refletir com a Coding Rights
Na oficina “Mapeando a Nuvem”, realizada no dia 7 de maio para os parceiros da Heinrich Böll Brasil, a organização Coding Rights promoveu uma discussão para pensarmos a internet para além de uma nuvem abstrata. A partir do “Mapa dos Territórios da Internet”, elaborado pela organização, disponível para download, visualizamos as dimensões físicas e geopolíticas da internet.
Segundo a diretora executiva da Coding Rights, Joana Varon, a oficina buscou "analisar a interseccionalidade das pautas de vários movimentos sociais, envolvendo tecnopolítica, feminismos, movimentos de justiça ambiental e movimentos de território, já que nos dias de hoje as tecnologias perpassam muitas lutas sociais”. Como a Fundação Böll Brasil busca, justamente, produzir conhecimento acerca dessas temáticas, ela apoiou a realização dessa roda de conversa.
Nessa perspectiva, foram convidadas organizações de todo o Brasil. Tapajós de Fato, de Santarém (PA); Terra de Direitos, de Curitiba (PR); Instituto Odara, de Salvador (BA); Cfemea, de Brasília (DF); Portal Catarinas, de Florianópolis (SC); Mídia Ninja, de Aracajú (SE); Amazônia Real, Observatório de Favelas e O Clima é de Mudança, todos do Rio (RJ) e KOINONIA, do Rio, São Paulo e Salvador. Com diferentes olhares, elas se cruzam na defesa de alguns temas: gênero, justiça socioambiental, tecnopolítica e direitos humanos.
A Internet, de nuvem, não tem nada
Ao “materializar a nuvem”, pode-se revelar o que existe por trás de algo que está no imaginário social como “abstrato”. Para a existência da internet é necessário extrair recursos naturais finitos, e esse processo impacta nos territórios urbanos, rurais, quilombolas e indígenas. Além disso, a cartografia permite enxergar as “relações de poder que perpassam o funcionamento da rede, desde a camada da infraestrutura física até a esfera das decisões algorítmicas”. Também ficam mais evidentes as práticas de colonialismo digital e o estabelecimento de monopólios.
Um exemplo disso são dados das relações de extração de minério. Como apontado pelo mapa, segundo uma reportagem exclusiva do Repórter Brasil, o ouro “é extraído ilegalmente das terras indígenas Kayapó, Munduruku e Yanomami, agora negociados por refinadoras fornecedoras da Apple, Microsoft, Google e Amazon.”
O mapa também cita o relatório Global Connectivity Report 2022 para apresentar os diferentes níveis de conectividade no país, em 2022: Sudeste 82%; Nordeste 78% (*18% via 3G/4G); Sul 81%; Norte 76% (*33% via 3G/4G) e Centro-Oeste 83%”. Dessa forma, ajuda a entender as especificidades de cada região, mencionando inclusive outros tipos de territorialidade: 43% dos moradores de favelas tem acesso precário à rede (2021).
Além disso, ele aponta que as questões ambientais e sociais se cruzam com a necessidade de infraestrutura que a internet precisa: um dos maiores Data Centers do Google no mundo fica em The Dalles, Oregon, nos EUA. O consumo de água para o funcionamento deste banco de dados gigante quase triplicou nos últimos 5 anos, utilizando mais de 25% da água fornecida à cidade.
Mãos na massa
A primeira parte do evento foi a apresentação do Mapa dos Territórios da Internet ao grupo. Divididas em pequenos núcleos, as organizações responderam como a internet impacta os espaços com os quais se relacionam. Como esperado, a gama de perspectivas foi extremamente variada, refletindo a diversidade territorial dos participantes presentes na conversa.
Lennon Medeiros da Visão Coop, organização da Baixada Fluminense (RJ), falou sobre a exploração de minério em uma das discussões:
“Pensando em água e energia, com grande investimento em tecnologias verdes, vemos alternativas sustentáveis. Em contrapartida, não encontramos nenhuma alternativa para o extrativismo. Falta uma percepção sobre quais são os modelos de reciclagem eletrônica, trabalho com resíduos e outras alternativas para a construção de hardwares".
Em seguida, os grupos se reorganizaram para pensar as ações de resistência que já estão sendo desenvolvidas. Dentre elas, o letramento digital assumiu um protagonismo, porque apareceu na maior parte dos debates. Somente com o letramento será possível pensar em questões como soberania digital no Brasil, que diz respeito ao monopólio que poucas empresas detêm sob os dados da população, das universidades e, até, do governo. O que falta para investir em softwares livres? Será que essa questão chega ao debate público? Foram algumas das questões levantadas.
Por fim, a última dinâmica do encontro explorou a imaginação dos participantes. A partir do Oráculo para Tecnologias Transfeministas, outro projeto da Coding Rights que está disponível para download, tiramos cartas e nos libertamos das amarras do real para pensar um futuro de tecnologias alternativas, transfeministas e decoloniais. Dessa vez, todos os grupos trabalharam com diferentes cartas, mas uma especial em comum, com a seguinte ideia:
Sobre a Coding Rights
É uma organização que atua sob ótica feminista interseccional, decolonial e antirracista. Nesse sentido, ela promove debates acerca do desenvolvimento, regulação e uso das tecnologias. Suas atividades incluem pesquisas, incidência política, desenvolvimento de ferramentas tecnológicas, capacitação em cuidados digitais e algumas outras mais. Saiba mais sobre site e assine a Empolvecida, grupo de notícias da Coding no Whatsapp.
A Fundação Heirich Böll e a Tecnopolítica
O programa de tecnopolítica da Fundação Böll Brasil busca fomentar a consciência social de que as tecnologias não são neutras. A Fundação, junto aos seus parceiros, defende que elas sejam difundidas e criadas respeitando os direitos humanos. Por isso, apoia entidades e pesquisadores em suas estratégias de enfrentamento aos riscos do aumento da desinformação e da vigilância.