O Clima do Negócio e o Negócio do Clima - O BNDES e a Economia Verde
INTRODUÇÃO
Joseph Stiglitz, ex-vice-presidente do Banco Mundial e posterior “crítico” das Instituições Financeiras Multilaterais (IFM), e Nicholas Stern, autor do Estudo Stern: Aspectos Econômicos das Alterações Climáticas, que em 2006 demonstrava os impactos e custos econômicos das mudanças climáticas, vêm há alguns anos atuando na linha de frente de uma campanha pela criação de um Banco do Sul Global, que tem como objetivo o financiamento de projetos de “infraestrutura e de desenvolvimento sustentável”.
O que sustenta essa proposta é a crença de que o futuro será escrito pela noção de “crescimento de baixo carbono” e por uma nova revolução energética-industrial. Um outro modelo de desenvolvimento que necessitará de investimentos massivos não só para combater a pobreza, mas também a mudança climática. Energia, projetos de infraestrutura, ajustes tecnológicos e o “mercado” são apresentados como os meios para “salvar” a humanidade da fatalidade que é a crise climática.
Os responsáveis por esta “salvação”, além do setor privado, seriam os bancos de desenvolvimento, em especial aqueles do Sul Global, como, por exemplo, o banco do bloco composto pelo Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul (Brics), o Novo Banco de Desenvolvimento (NBD), com capital total para empréstimos de US$ 50 bilhões e cujos primeiros empréstimos foram para projetos de “energia renovável” do Banco Canara da Índia e do BNDES em abril deste ano, financiados, em parte, por “títulos verdes”. Para tanto, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) aparece como uma importante referência de banco nacional do Sul Global, que investe em infraestrutura e no desenvolvimento de tecnologias “carbon friendly” ou de baixo carbono.
No entanto, o que de fato está sendo feito em nome do clima? Quais são as possíveis consequências políticas, culturais e territoriais da apropriação da questão ambiental e climática por parte dos Estados, das empresas e dos bancos? Como a energia, a infraestrutura e a tecnologia podem resolver um problema estrutural da lógica de desenvolvimento e do sistema capitalista? Qual o papel do BNDES neste processo?
Aqui cabe fazer uma breve retrospectiva para situar melhor como tem sido a atuação deste banco. Por ocasião da comemoração dos 60 anos do BNDES, em 2012, o ex-presidente Luciano Coutinho (BNDES, 2012a), afirmou: “Em certa medida, a história do BNDES se confunde com a história econômica do país”. De fato, desde a sua fundação em 1952, o BNDES passou por diversas transformações em relação à sua atuação enquanto “verdadeiro agente de transformação, financiando projetos e empreendimentos que impulsionaram o desenvolvimento do Brasil” (Ibid.). Este processo histórico envolve, inclusive, a internacionalização do Banco que hoje não só conta com escritórios em Montevidéu e Londres, mas também com acordos de cooperação com outros bancos em nível internacional, como foi o caso dos bancos dos Brics, e participa de diversos espaços internacionais de elaboração de políticas, como a Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (CQNUMC).
Sendo este banco que se confunde com a história do país, que se adapta às mudanças políticas nacionais e globais e, muitas vezes, as impulsiona, o BNDES, como outros bancos de desenvolvimento, também entrou na “onda” ambiental, “ambientalizando-se”, e tornou-se um relevante financiador e indutor de políticas públicas no campo que podemos chamar de economia verde ou de baixo-carbono.
Uma economia de baixo carbono é entendida, de acordo com o Banco Mundial (2010), como aquela onde os processos econômicos envolvendo, por exemplo, o uso da terra e de florestas, transporte, energia e resíduos urbanos, sólidos e líquidos são menos intensivos em carbono. Na perspectiva do BNDES, são “iniciativas inovadoras para o financiamento de propostas que compatibilizem o desenvolvimento com a sustentabilidade socioambiental”. Tais iniciativas priorizam projetos relacionados à denominada energia renovável, alternativa ou limpa, como hidrelétricas, eólicas e Biomassa, como também projetos de reflorestamento ou de redução do desmatamento. As energias são consideradas renováveis quando suas fontes são naturalmente reabastecidas pela própria natureza e limpas quando não liberam resíduos ou gases poluentes geradores do efeito estufa.
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Índice
SUMÁRIO
Apresentação – 9
1. Introdução – 13
2. A ambientalização do BNDES e a economia verde – 19
2.1 O setor energético: apoio à energia “alternativa” (alternativa a quê?) – 25
2.2 Florestas, biodiversidade e a construção de ativos ambientais – 31
2.2.1 O Fundo Amazônia – 32
2.2.2 A construção de ativos ambientais: o carbono como nova moeda global? – 34
2.3 Economia de baixo carbono – 35
3. A internacionalização do BNDES e a noção de “infraestrutura sustentável” – 39
4. Por que economia verde? Construindo outra linha do tempo... – 51
4.1 “Revolução energética e industrial”: apropriação da noção de crise climática – 51
4.2 Reducionismo tecnológico e o negócio dos ventos – 58
4.3 Ativos ambientais, baixo carbono e o desmatamento evitado: fetichismo do CO2 – 62
5. Considerações Finais – 66
Referências – 68