Prêmio Chico Mendes de Resistência 2023: Um legado que olha para o futuro

Laiane é moradora da Reserva Extrativista Chico Mendes em Brasileia, Acre, tem 32 anos, é ativista ambiental, sindicalista rural, técnica agrícola e estudante de Sociologia.

Se o seringueiro e liderança popular Chico Mendes estivesse vivo ele teria completado 79 anos, na última sexta-feira, 15 de dezembro. Passaram-se 35 anos desde do dia do assassinato, mas o legado de Chico Mendes está presente e segue inspirando a luta pela defesa da floresta e da Amazônia. Nesse sentido, acontece até o dia 22 de dezembro a “Semana Chico Mendes 35 anos – Empate de Retomada” em Xapuri, Rio Branco, Assis Brasil e Epitaciolândia, municípios localizados no Acre. São dias de eventos nos quais 35 vozes são homenageadas pela importância de suas resistências e lutas.

O principal momento da Semana aconteceu na sexta-feira, dia 15, quando foi realizada a cerimônia de entrega do Prêmio Chico Mendes de Resistência 2023. “A premiação reconhece aqueles que, de maneira exemplar, mantêm viva sua visão para a Amazônia e seus povos”, afirma o Comitê Chico Mendes. (Leia mais nas matérias da Amazônia Real e Mídia Ninja)

Foram premiadas organizações como Mídia Ninja, Amazônia Real, Tapajós de Fato, que são também parceiras da Fundação Heinrich Böll, e personalidades como Laiane Santos.

Laiane é moradora da Reserva Extrativista Chico Mendes em Brasileia, Acre, tem 32 anos, é ativista ambiental, sindicalista rural, técnica agrícola e estudante de Sociologia. Ela nos contou mais sobre o prêmio e sua trajetória.

Böll Brasil: Qual é a importância do Prêmio Chico Mendes e como você se sentiu por ser escolhida para recebe-lo?

Laiane Santos: O Prêmio Chico Mendes de Resistência é considerado a mais alta honraria para nós, que somos do movimento Social. Para mim foi uma surpresa ser agraciada com esse prêmio, pois fazemos a luta sem esperar nada em troca, principalmente um prêmio tão importante. A luta e defesa que faço é porque não consigo ver pessoas sofrendo ou sendo invisibilizadas e silenciadas e ficar sem fazer nada. Creio que como ser humano o meu dever é defender as minorias, pois eu também faço parte dela. Então fico muito feliz e honrada em receber este prêmio e também me sinto mais compelida a perseverar [a floresta]. Me sinto mais motivada a continuar, pois é bom saber que o que estou fazendo é o certo e que têm pessoas admirando a minha luta, enquanto para mim é o dia a dia.

Böll Brasil: Você ganhou o Prêmio na categoria liderança jovem, qual é o papel dos jovens na defesa da Floresta em pé hoje? E nas mudanças climáticas?

Laiane Santos: O jovem é um trunfo essencial da floresta, pois além de ter mais energia para fazer a defesa, também tem o entusiasmo para fazer algo diferente. O jovem também lidera nas questões tecnológicas e de comunicação, assim isso faz com que a nossa luta seja vista não só por nós mais também em todos os lugares do mundo. Com isso as nossas atividades do dia a dia estão mais conhecidas por diferentes culturas. O jovem não é o futuro, ele é o presente. Ele luta para reconhecerem isso, pois o futuro é distante mais o presente é agora.

Böll Brasil: Quais são os principais desafios da Reserva Extrativista (Resex) Chico Mendes, no Acre, e nesta região?

Laiane Santos:  Entre os principais desafios está a grande quantidade de pessoas que não são nativas da Resex, morando hoje na Resex. Isso impacta diretamente no modo de vida das pessoas, pois uma cultura acaba interferindo na outra e as pessoas que vem de fora geralmente não respeitam o modo de vida dos extrativistas. Eles acabam pressionando para que sejam desmatadas áreas para criação de gado branco, uma cultura [modo de vida] que não era do extrativista, mas que acabou sendo imposta.

Böll Brasil: Você pode nos contar brevemente sobre seu trabalho de mobilização?

Laiane Santos:  Como eu conheço a maioria das comunidades na área rural de Brasileia pelo meu trabalho no Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Brasileia, sou frequentemente procurada para mobilizar, na maioria das vezes, os moradores da Resex Chico Mendes. Eu só consigo fazer isso graças a confiança que eles têm em mim e com isso fica mais fácil quando a necessidade é de mobilização dos jovens, principalmente as mulheres. Quando não é o pai que as impede [de participarem], é o marido, mas eles permitem que elas saiam porque sou eu que as convido.

Böll Brasil: Em uma das descrições do prêmio, você é apresentada como feminista. Por que o feminismo é importante na luta por justiça socioambiental?

Laiane Santos: O feminismo é um dos fatores mais importantes na nossa luta, pois só com compreensão do que é feminismo, é que nos damos conta de que as mulheres raramente são ouvidas, e que em todas as situações de luta ou tragédias ambientais as mulheres são as mais impactadas e elas não têm essa noção. Quem ganha os méritos das causas são os homens e já estamos cansadas de ver grandes mulheres sendo invisibilizadas por homens, ou que elas mesmas achem que seu único papel em uma luta é cozinhar para quem está à frente. [É preciso] Fazê-las entender o quão são importantes e que suas vozes devem ser ouvidas. Podemos usar os conceitos do feminismo para explicar isso a elas na linguagem delas, mostrando que os homens não podem falar pelas mulheres, pois eles não têm noção do que sentimos e de como nossos corpos sofrem com as mudanças, tanto climática quanto sociais.