Deputado alemão visita degradação socioambiental da soja no Matopiba e práticas agroecológicas no Norte e no Sul do país

Martin Häusling visita o Brasil para conhecer projetos agrícolas

Deputado no Parlamento Europeu desde 2009, o alemão Martin Häusling, do Partido Verde, está visitando o Brasil no final de outubro. Estará presente em pelo menos dois estados, onde pretende visitar especialmente áreas onde a expansão da produção de soja e eucalipto vem causando forte impacto socioambiental. O deputado também vai se encontrar com lideranças de movimentos, povos e comunidades tradicionais para conhecer iniciativas de agroecologia.

Häusling atua, há anos, na defesa da agricultura orgânica e de formas mais sustentáveis de agricultura. Nesta entrevista, ele fala sobre a expectativa das visitas em território brasileiro. Fala também do debate na Europa sobre a indústria da carne brasileira, e sobre o resultado das eleições realizadas recentemente na Alemanha.

No parlamento europeu, Häusling integra a Comissão da Agricultura e do Desenvolvimento Rural (AGRI), onde é o relator do grupo parlamentar em produção orgânica e rotulagem de produtos orgânicos. Häusling também é membro da Delegação à Assembleia Parlamentar Euro-Latino-Americana (DLAT). Leia a entrevista na íntegra:

1) Quais são as suas expectativas sobre a visita ao Brasil? Quais os lugares você vai visitar e quais os principais objetivos durante a viagem?

Assim como as minhas viagens ao Chile, Argentina e Paraguai, eu gostaria de visitar e ver diferentes exemplos de sistemas de agricultura e comércio na América do Sul.

Por outro lado, está em curso uma gigantesca industrialização na agricultura brasileira: áreas naturais como o cerrado são transformadas em vastas regiões de monocultura com uso intensivo de agrotóxicos. Quais as consequências para os camponeses que vivem lá? Quais são os efeitos sobre os recursos naturais?

Em contrapartida, existem movimentos fortes de populações rurais que defendem sua casa e a natureza do entorno e projetos de manuseio sustentável da terra, agricultura orgânica e comércio local, e isso dá esperança de que um outro e melhor modelo de desenvolvimento na agricultura é possível. Esses exemplos eu também irei visitar.

2) O Brasil é um país em que o poder político e econômico do agronegócio é muito forte. A vida não é fácil para pequenos agricultores e comunidades tradicionais. Na sua opinião, quais são os efeitos de um poderoso agronegócio para este país e para a ordem econômica mundial? Quais as mudanças políticas seriam necessárias para implementar modelos alternativos de agricultura? Quais os principais desafios da política agrícola (em relação à União Europeia e ao Brasil)?

As pesquisas internacionais demonstram em todo o mundo que o modelo industrial de agricultura falhou. Ele falhou em enfrentar a fome, falhou no uso sustentável de recursos, falhou em frear a perda de biodiversidade, falhou em desenvolver áreas rurais. Quanto mais o Brasil investir neste tipo de agricultura e comércio, que extrai os recursos naturais brasileiros em nome do lucro de poucas grandes corporações mundiais, menos a população brasileira vai ter benefícios disso.

Na Europa, existe um movimento crescente contra este tipo de agricultura e comércio. Mesmo se nós tivermos regulações mais fortes e melhor controle, nem tudo será um mar de rosas. As pessoas não suportam mais sistemas agrícolas, que poluem a água, atormentam animais, contaminam a natureza e a comida com agrotóxicos e não trazem benefícios suficientes para as famílias de agricultores. Mais e mais pessoas na Europa estão cientes de que a produção e o consumo de carne no continente cresceu com os grãos brasileiros e às custas da natureza e dos camponeses brasileiros.

Por isso na minha opinião nós temos que lutar por mudanças nos dois lados do oceano Atlântico ou em todo o mundo. Nós precisamos de um sistema de produção mais sustentável, que proteja o meio ambiente, garanta também um padrão justo de vida para pequenos agricultores, respeite o bem estar animal e mantenha nossos recursos para as próximas gerações (solo, clima, água).

3) No Brasil, nós tivemos recentemente uma grande crise na nossa indústria de carne. A Polícia Federal brasileira colocou em campo a operação “Carne Fraca”, denunciando corrupção e manipulação de dados. Como parlamentar, você está envolvido em discussos sobre a carne e políticas para a carne. Existe este debate sobre o escândalo da carne brasileira na Europa? Se existe, isso teve alguma consequência política ou econômica?

Nós discutimos o escândalo da carne brasileira muitas vezes na Comissão da Agricultura e do Desenvolvimento Rural (AGRI) do Parlamento Europeu. Havia uma enorme preocupação de políticos e consumidores se deveríamos ou não confiar na importação de carne do Brasil. Mas a preocupação não está relacionada somente ao escândalo. Com as negociações do Mercosul, importação de carne por acordos de comércio são vistas em geral como um problema.

Assim como no Brasil, o gado é mantido no pasto através de um sistema de pecuária extensiva de produção de carne na Europa. Isso conserva a pastagem e sua biodiversidade, e gera renda a camponeses de regiões menos avantajadas. É portanto um sistema que promove biodiversidade, protege o clima e preserva a existência em áreas rurais. Por isso, é muito benéfico, e é chamado na Europa de “agricultura de alto valor natural”.

Produção de leite e reprodução de gado são atividades muito importanets nas regiões menos privilegiadas da Europa. Importar mais carne do Brasil poderia gerar uma grande pressão econômica nestes sistemas de pecuária e fazendas familiares.

Eu gostaria de apontar algumas demandas dos Verdes (partido de Häusling) para o comércio global:

A União Europeia deveria defender a inclusão de padrões ambientais e sociais nos parâmetros de comércio internacional e nas negociações da Organização Mundial do Comércio (OMC).

Para todas as negociações de comércio em andamento, especialmente para os acordes de livre comércio bilaterias com países do Mercosul e a Índia, uma detalhada taxação dos impactos deve ser submetida.

Agricultura tradicional, direitos locais e de comunidades tradicionais devem ser incluídos nas “Diretrizes Internacionais pelo uso responsável dos recursos da terra”.

4) Tivemos eleições na Alemanha recentemente. Você poderia avaliar rapidamente os resultados? Qual a sua opinião sobre o desempenho do Partido Verde?

O Partido Verde consolidou sua posição em torno de 8%. Isso não é fantástico mas também não é ruim. Na próxima semana, os Verdes vão realizar fortes negociações de coalizão com os conservadores e os liberais para criar o que está sendo chamado de “coalizão Jamaica”. Nós não queremos que a Alemanha se torne um estado neoliberal em direção à era do gelo, colocando em risco o futuro das crianças em um mundo dirigido pelo dinheiro. Os Verdes querem contribuir com uma sociedade liberal mas calorosa baseada em uma economia ecológica e sustentável, que beneficie todos os cidadãos, e não somente parte deles.

5) Você poderia dividir sua análise sobre o crescimento de partidos de extrema direita na Alemanha e em outros países do mundo?

O que é realmente preocupante é a porcentagem alta que o partido “Alternative für Deutschland” (AfD) atingiu. É a primeira vez desde a Segunda Guerra Mundial que um partido de extrema direita tem tantas cadeiras no parlamento alemão. Nós teremos que combater esse movimento com todas as forças democráticas que nós temos na Alemanha.

Site oficial:

http://www.europarl.europa.eu/meps/en/96752/MARTIN_HAUSLING_home.html

Publicações em inglês recomendadas por Martin Häusling:

http://www.martin-haeusling.eu/presse-medien/publikationen/publikation-…

Tradução: Leandro Uchoas