Construindo a soberania energética e alimentar - Publicações

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APRESENTAÇÃO

Lucia Ortiz


A expansão dos agrocombustíveis, em monoculturas de escala industrial destinadas ao abastecimento de um mercado global crescente de energia, tem sido justificada como estratégia de enfrentamento das mudanças climáticas, de substituição parcial do petróleo, que chega ao seu pico de produção mundial, e até mesmo de “desenvolvimento rural”. Entretanto, o modelo do agronegócio, além de petrodependente na sua forma de produção e logística de distribuição em escala planetária, está associado a impactos ambientais e sociais que, em última análise, inviabilizam a produção e distribuição descentralizada de alimentos e de energia, mais eficiente e mais saudável ao ser humano e ao ambiente. Assim mesmo, segue avançando sobre os territórios onde se dá a reprodução social das dinâmicas camponesas, especializando-os na produção monocultural, mecanizada, calcada no emprego de agrotóxicos e biotecnologia, que não se destina às necessidades locais e acaba por reduzir a diversidade biológica, social e cultural e, assim, as bases para o suprimento destas mesmas necessidades.


Como via construtiva de resistência e enfrentamento deste modelo, três exemplos de produção descentralizada de combustíveis, a partir da biomassa, consorciada e destinada ao fortalecimento da produção de alimentos na agricultura familiar, são apresentados aqui, em seguimento a uma reflexão sobre os conceitos e os desafios para a construção da soberania dos povos sobre os territórios, num contexto global de apropriação e commoditização da natureza agravado pela febre dos agrocombustíveis. Todos estes exemplos, protagonizados pelos movimentos de pequenos agricultores e trabalhadores rurais no Rio Grande do Sul, e concretizados pelas cooperativas COOPERCANA, CRERAL e COOPERBIO, apontam caminhos, desafios concretos e as contradições enfrentadas na construção da soberania alimentar e energética. Ainda que viabilizados a partir de realidades bem particulares, em termos de localização geográfica, histórico de ocupação territorial, estrutura fundiária, surgimento e organização dos movimentos sociais, mostram que a produção, assim como a gestão e decisão sobre as políticas de energia, podem e devem ser integradas na construção da sustentabilidade e da soberania dos atores locais. O papel das energias renováveis neste contexto é o de alimentar os processos de localização das economias, servindo de combustível que as revigore e reproduza, e contrapondo-se assim à expansão do mercado global dos agrocombustíveis. E este caminho exige políticas específicas, como as que já estão sendo propostas pelo campesinato.