Estudo feito por pesquisadores da UERJ aponta que comportamento entre facções e milícias no Rio de janeiro está cada vez mais parecido

O Cidades Núcleo de Pesquisa Urbana, formado por pesquisadores da UERJ, divulgou a pesquisa “Milícias, facções e Precariedade: um estudo comparativo sobre as condições de vida nos territórios periféricos do Rio de Janeiro frente ao controle de grupos armados”, apoiada pela Fundação Heinrich Böll Brasil e disponível para download aqui. O principal objetivo do estudo, feito através de trabalho de campo realizado em seis áreas da cidade, é descrever o funcionamento das dinâmicas de controle territorial de grupos armados e o efeito causado na rotina dos moradores de bairros periféricos como Batan, Caju, Campo Grande, Ilha do Governador, Praça Seca e Tijuquinha.

Trecho do Mapa de territórios em disputa do crime organizado

O trabalho de campo, realizado por cinco pesquisadores da UERJ, investigou diferenças e semelhanças na relação de grupos armados com moradores e suas organizações. O principal resultado da pesquisa aponta que a atuação desses grupos  é determinada pela presença ou ausência de confrontos nos territórios onde a pesquisa de campo foi realizada. 

Além disso, o estudo também aponta que, em regiões onde não há confronto policial, os grupos armados têm uma presença mais difusa no território e, diante disso, os moradores sentem o impacto do controle de forma diferente dos moradores de locais onde a presença de grupos armados é mais ostensiva. 

O que também chamou a atenção dos pesquisadores foi o fato de que a frequência dos confrontos ou a ameaça constante de que eles aconteçam acabam produzindo uma sociabilidade local mais conflituosa, através de altos graus de vigilância e monitoramento por parte dos grupos armados, fato que tem gerado constante reclamação de moradores por conta da ausência da  “paz” que teria caracterizado momentos anteriores, seja em regiões dominadas por grupos de milícias ou por facções de traficantes de drogas. 

Mapa descritivo da ação das milícias em regiões do Rio de Janeiro

Superexploração econômica

Nos locais considerados “mais tranquilos” (Campo Grande e Tijuquinha), os pesquisadores conseguiram identificar que a superexploração econômica por parte das milícias (cobrança de taxas abusivas e monopólio de serviços) tornou a relação desses grupos com os moradores muito mais violenta e conflituosa.

Nas áreas onde as milícias são consolidadas, além da exploração econômica, também foram expandidos os tipos de recursos explorados por esses grupos, ou seja, não existem mais atividades econômicas que não sejam cobradas por eles. 

Conceitos inéditos

Durante o trabalho de campo realizado nos seis territórios objetos da pesquisa ( Batan, Caju, Campo Grande, Ilha do Governador, Praça Seca, Tijuquinha), também foram identificados novos fenômenos que podem ser classificados como "Empreendedorismo parasitário”, ou seja, quando todos os grupos armados compartilham do mesmo método de domínio dos territórios de pobreza por meio do uso da violência generalizada ou pontual, para garantir a submissão de moradores a elevados níveis de exploração através do pagamento de taxas sobre as mais diversas atividades econômicas. 

Outra prática identificada pelos pesquisadores é a “Operação consorciada entre milícias e facções”, uma superexploração econômica e extorsiva que não só deixou de ser uma atuação exclusiva das milícias, mas se tornou uma operação feita em conjunto entre facções de traficantes de drogas e integrantes dos grupos milicianos, que podem estar revertendo o lucro dessa exploração para a compra de armamentos, fato que pode ajudar a explicar tanto o aumento no número de confrontos como no poderio bélico desses grupos.

Tabela - Relação entre as áreas e ações do crime organizado

Moradores vivem “sob cerco”

A conclusão final da pesquisa aponta que independente dos grupos armados que controlam cada território, os moradores dessas regiões se habituaram a viver sob o cerco de organizações criminosas, sejam elas facções de tráfico de drogas ou das milícias. Segundo os pesquisadores, “viver sob cerco” é estar submetido a uma força coercitiva e violenta de forma cotidiana, em ato ou potência e, por conta disso, estar em permanente estado de preocupação com manifestações violentas que impedem a circulação e a manutenção de uma rotina segura aos moradores de favelas e periferias cariocas.