Valoração Econômica e Pagamento por Serviços Ambientais - Reconhecimento do Valor da Natureza ou Atribuição de Preço à Destruição da Natureza?
Introdução e objetivo
Apesar de concebida atualmente como um novo mecanismo de conservação ambiental e desenvolvimento sustentável, a valoração econômica da natureza não é novidade. Na realidade, ela está inserida na lógica da acumulação de capital presente em nossa sociedade há séculos.
Não obstante essa longa história de valoração econômica de determinadas porções da natureza, a abordagem atual apresenta novas características. Este artigo explora, assim, as diferenças entre as iniciativas recentes focadas em “acabar com a invisibilidade econômica da natureza” e as antigas perspectivas a respeito da sua valoração econômica.
Um dos aspectos que denotam a grande diferença entre uma abordagem e a outra é o contexto de crise em que a problemática ambiental está imersa hoje, no qual se incluem diversas dimensões econômicas, ecológicas e sociais. Outro grande contribuidor para a adoção de novos métodos é o aparente reconhecimento pelos principais atores políticos e econômicos de que a abordagem habitual está utrapassada. O presente trabalho mostra como, nesse contexto, a “contabilização verde” serve, antes de tudo e principalmente, para atrasar a transição necessária que nos levaria para longe de um modelo de desenvolvimento baseado em crescimento econômico através da destruição da natureza. A “contabilidade verde” reforça a centralidade no mercado por meio da noção de que, com o mecanismo certo de valoração e os instrumentos adequados de proteção ambiental, a economia irá automaticamente melhor precificar o valor da natureza. Consequentemente, este processo de visibilidade econômica levaria as grandes corporações a reconhecerem o valor do estoque de capital da natureza. Como resultado, a natureza seria protegida e o crescimento se tornaria “verde”.
Nessa narrativa sobre o potencial de valoração econômica da natureza para conservação da diversidade biológica também está implícita a redução da necessidade de regulamentações ambientais do tipo “comando-e-controle”. Outra mensagem implícita é de que as mais recentes iniciativas de valoração não são nada além de uma variação dos já experimentados e testados programas de “pagamento por serviços ambientais”, e de um aperfeiçoamento do princípio do “poluidor-pagador”, ambos já presentes no conjunto de ferramentas regulatórias ambientais. Além disso, os proponentes da valoração econômica da natureza argumentam que sua combinação com instrumentos centrados no mercado para a implementação de políticas alivia o Estado de boa parte da pesada tarefa de proteger a natureza. Esta tentativa de tornar a natureza economicamente visível pode, portanto, significar uma mudança paradigmática na estrutura da legislação ambiental.
O artigo explora, dessa forma, onde os sinais de tal mudança paradigmática já são perceptíveis e o que podemos aprender a partir das primeiras experiências desse novo modelo de precificação.
Quais são as relações entre os proponentes que parecem buscar fins bastante distintos através dos meios de valoração econômica da natureza?
O documento também observa algumas disparidades entre a retórica e a prática da valoração econômica da natureza. Um exemplo da distância entre teoria e realidade é o cálculo do valor econômico dos “serviços ambientais” quando as penalidades ou a remuneração nos programas de pagamentos por serviços ambientais, na verdade, não são baseados no número calculado para os serviços ambientais, mesmo quando tais números existem.
Ao desafiar alguns dos argumentos mais comuns apresentados no debate, o artigo apresenta uma sólida fundamentação para o argumento de que a valoração econômica ajudará, primordialmente, a colocar um preço na destruição da natureza em vez de contribuir para que o valor da natureza seja respeitado.
Detalhes da publicação
Índice
- Introdução e objetivo
-A atratividade da “Economia verde”
-Não é a primeira vez que a natureza se torna visível ao olhar econômico
-Do Pagamento por Serviço Ambiental aos Direitos Comercializáveis para Poluir ou Degradar
-Redefinindo o “verde”, e não o “crescimento”
-Os debates técnicos sobre a precisão do cálculo substituem os debates políticos sobre o que se produz, por quem e para quem
-Da natureza vinculada ao lugar à natureza determinada por um conjunto de indicadores
-A valoração econômica enquanto instrumento para a “completa internalização das externalidades”
-A valoração econômica foca nos serviços ambientais regulamentados por lei – quase que de forma exclusiva
-Quando o problema é confundido com a solução
-A valoração econômica da natureza enquanto ferramenta de comunicação para chamar atenção da sociedade, da iniciativa privada e dos atores políticos sobre as funções do ecossistema e sobre a contínua perda da diversidade biológica
-Incentivar financeiramente não é a mesma coisa que valorizar os serviços ambientais
-Os “fatores concretos” que a valoração econômica alimenta, fortalecem a proposta de conservação
-Apenas mais uma ferramenta na estrutura das políticas públicas
-A valoração econômica enquanto uma maneira de “transformar a legislação ambiental em instrumentos comercializáveis”
-Os níveis máximos de degradação ou poluição agora são os novos mínimos
-“Perda líquida zero” não é zero
-A valoração econômica como uma ferramenta para melhor compensar as vítimas de catástrofes ambientais ou aqueles afetados pela destruição ecológica
-A linguagem da valoração econômica oculta os conflitos sobre o uso da natureza
-A valoração econômica da natureza - meios para diferentes fins
-Conclusões
-Notas de Rodapé